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Comecei a escrever no momento em que percebi que só pensar não mais me satisfazia.

Precisava transbordar todo aquele pensamento que só ao meu universo de idéias pertencia.

Hoje, escrevo por pura necessidade, por irresistível vício e por agradável teimosia.




Claudia Pinelli Rêgo Fernandes ®



terça-feira, agosto 01, 2006

O Poeta Que Servia Chá Aos Fantasmas



O poeta que servia chá aos fantasmas

Uma homenagem ao centenário do poeta gaúcho Mário Quintana.

Lula Miranda

Quando estive em Porto Alegre para uma das edições do Fórum Social Mundial, aproveitei para realizar uma inadiável e tardia visita: conhecer a Casa de Cultura Mário Quintana (na foto). Assim como quem vai a Salvador é fundamental conhecer a igreja do Senhor do Bonfim ou o Pelourinho, quem vai a Porto Alegre não pode esquecer de incluir em sua agenda uma visita a esse centro de cultura e lazer, situado no prédio em tom róseo onde antes funcionava um hotel que serviu de residência, de 1968 a 1980, ao poeta Mário Quintana.

Chegar à Casa de Cultura foi uma (a)ventura cheia de encantamentos. Fui caminhando calmamente pelas ruas do centro da capital gaúcha, como que cumprindo os mesmos caminhos do velho poeta. Passei por suas vastas e bem cuidadas praças, por suas ruelas decadentes e seus paços imperiais. Seguia os passos do poeta e, com estranha complacência e carinho paternal, observava os transeuntes à minha volta. Imaginei o velho Quintana naqueles bancos de praça, em sua tranqüila solitude, lendo seu jornal diário, fumando seu inseparável cigarro e observando a gratuita poesia do cotidiano. Como um príncipe em sua serena sabedoria que só o tempo e a maturidade revelam.Seguia, curioso e respeitoso, o caminho rumo à casa do poeta.

Sempre acompanhei com muito carinho a condição daquele homem já idoso, que, com sua alma de criança, escrevia versos leves de uma singela e inefável beleza. Um grande poeta se escondia naquele “velhinho” solitário e frágil, que se abrigava num quarto de hotel. Não um hotel qualquer, mas no Hotel Majestic, também ele cúmplice e vassalo do tempo em sua beleza e majestade. Aquela casa que acolhia o poeta parecia encerrar em seus domínios, e em sua história, rara poesia.“Eu sou como um velho arqueólogo decifrando as cinzas/ de uma cidade morta” – já disse Quintana em um de seus poemas. O poeta e seus espectros. As minhas retinas, não suficientemente fatigadas pelo tempo, nada percebem.

Aos olhos de um poeta menor, um “estrangeiro”, a cidade parece ainda viva em sua urgência e pressa. Mas procuro nas sombras e nas dobras das esquinas, e do tempo, a cidade perdida do poeta Quintana. Procuro a sua poesia dispersa nos descaminhos da cidade e do olvido; a sua Porto Alegre.Seguindo seus sinais chego ao velho Majestic em sua imponência tardia. Mas chego tarde. O hóspede célebre e recôndito já não vive nesse endereço. O Hotel Majestic tampouco existe. O velho hotel cedeu espaço à casa de cultura que hoje acolhe algumas lojas e bares. Mas onde estariam os aposentos do poeta, seus vestígios? Subi alguns degraus de uma escadaria e encontrei ali uma espécie de memorial ao poeta Mário Quintana. Numa espécie de vitrine estavam dispostos alguns singelos objetos de uso pessoal, um ou outro manuscrito, alguns livros e fotos.

Fiquei por um lapso de tempo ali contemplando aquele relicário e lembrando alguns de seus poemas, como que numa prece penitente. A sensação foi similar a que sinto quando visito a igreja do Bonfim, quando vou à Bahia. Fui tomado por forte sentimento de religiosidade e fé. Saí dali fortalecido e renovado na coragem e disposição para enfrentar o mundo.

Saí do velho Majestic e retomei o caminho de volta para o meu hotel. Lembrei do lema do Fórum Social Mundial: um outro mundo é possível. Lembrei de um certo poema do velho Quintana, que hoje uso como uma espécie de mantra: “Todos esses que aí estão/ Atravancando o meu caminho,/Eles passarão.../Eu passarinho!”. Com a leveza de Quintana fica mais fácil cumprir os caminhos.Quem faz uma visita ao poeta – à sua obra ou à sua casa, afinal os poemas são a verdadeira morada do poeta – experimentará, um pequeno milagre. Os poemas são, na verdade, para todos e não só para os poetas, um abrigo – como as igrejas – que conforta e transforma.

Eis o verdadeiro milagre!

Depois que visitei a morada do poeta nunca mais fui o mesmo homem. Talvez resida aí o milagre da poesia.

Textos de Mário Quintana:

Da Vez Primeira...

Da vez primeira em que me assassinaram
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha...
Depois, de cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha...

E hoje, dos meus cadáveres, eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada...
Arde um toco de vela, amarelada...
Como o único bem que me ficou!

Vinde, corvos, chacais, ladrões da estrada!
Ah! desta mão, avaramente adunca,
Ninguém há de arrancar-me a luz sagrada!

Aves da Noite! Asas do Horror! Voejai!
Que a luz, trêmula e triste como um ai,
A luz do morto não se apaga nunca!

O Milagre

Dias maravilhosos em que os jornais vêm cheios de poesia... e do lábio do amigo brotam palavras de eterno encanto...
Dias mágicos... em que os burgueses espiam, através das vidraças dos escritórios, a graça gratuita das nuvens...


Viva Mário Quintana!!!! Um dos meus poetas preferidos, pela forma simples que escrevia sobre o ser humano num texto de um dos meus escritores preferidos, Lula Miranda... Perfeito..

Bjo.



Música: Script of a Dead Poet do Alphaville.

4 comentários:

Pierrot disse...

Quintana... uma das mais belas almas que este país teve a honra de receber...

Pierrot disse...

bom... eu estudei... de 2000 a 2004 8ª a 3º ano... talvez nao lembre de mim, tb nao a reconheço por esta foto... fui do gremio por 3 anos... eu mudei neste tempo... como sempre mudando... mas é isso...

Pierrot disse...

AH... vc acertou.. realmente eu estava muito inspirado... entre no meu diario...

www.diariodeumpierrot.blogspot.com

a penseira uso apenas para meus poemas...

Pierrot disse...

você colocou no meu post Infinito...

Aqui eu interpreto como o momento do amor, do ato em si, da cama..

P mim, ficou claro aqui:
"respirar o cheiro da vida, da paixão, da deusa
ter seu corpo sem forças
a um passo do nada"

Ali td tem q parecer infinito..
Muito lindo esse poema..
Bjo p vc..


essa foi a inspiração...

eu sai do bart em 2003 e nao em 2004 como havia colocado... ou seja, vc nao me conheceu...
bjao

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My kind of Spirit...


You are the elusive Night Spirit.
Your season is Winter, when the stars are bright and frost crystallizes the fallen leaves.
You are introspective, deep-thinking, and mysterious.
Everyone is intrigued and a little intimidated by you because you have an aura of otherworldliness.
You work in extremes, sometime happy, other times sad, but always creative and philosophical.
You are more concerned with the unseen, mystical, and metaphysical than the real world.
Night Spirits have a tendency to get lost in themselves and must be careful not to forget reality, but their imagination is limitless.