Uma pitada de sal, uma porção de magia, um naco de poesia
Os que acompanham os meus textos, aqui mesmo nesse espaço do Arte & Cultura, sabem que é um tema recorrente em minhas crônicas a denúncia da rotina e do cotidiano como impiedosos assassinos da poesia e da magia que se pode garimpar, ainda que com um pouco de esforço, paciência e dedicada atenção, aqui e ali, vida afora, mesmo em meio a esses nossos dias de automatismo e frêmito arrivista.
Nesses dias tão pródigos em cascalho, dejetos, joio e farelos, e tão pobres em cultura e arte/imaginação, o ato de buscar pérolas e alegrias, aqui e ali, agora, alhures e algures, pode parecer a alguns algo inútil. Porém, provecto garimpeiro que sou, asseguro-lhes que escrever sobre certos temas preciosos, e esse é um desses temas, nunca é demasiado. Isto posto, e no caso da sua concordância, caro leitor, sigamos em frente procurando, como sempre, em meio ao barro e ao cascalho dos dias, algo a reluzir. Vamos nessa, então?
Brenda e Jasmim apareceram para mim como fruto da magia do cinema, a partir de um DVD de R$9,90 (pouco mais de 3 dólares e pouco menos 3 euros, para os que estão mais alhures, em outras fronteiras – portanto, uma pechincha!). Brenda e Jasmim são duas personagens do filme Bagdá Café. Esse filme, esclarecendo para os que não o assistiram, foi cult na década de 1990 (ou terá sido 1980?) e conta a história de duas mulheres “abandonadas” pelos maridos – na verdade, as duas não foram propriamente abandonadas, mas, principalmente a irascível Brenda, para ser mais fiel aos fatos, escorraçaram seus homens, medíocres homens, de suas vidas.
Não conto mais detalhes do filme para não ser estraga-prazeres daqueles que ainda não o viram. Mas do encontro dessas duas mulheres, dessas duas realidades, dá-se um pequeno milagre. O milagre do encantamento entre seres humanos, tão diversos e solitários, encerrados em seus mundos. O milagre da amizade desinteressada, da magia, da compreensão, da tolerância, da solidariedade – preciosidades raras de se encontrar nos dias em que vivemos. A magia aqui não servirá como mera figura retórica, mas, de fato, no filme a mágica é um instrumento de encantamento e integração entre as pessoas. Jasmim descobre em meio a sua bagagem (na verdade, a bagagem do “ex”) uma caixa com pequenos truques de mágica de salão do tipo “faça você mesmo”. Para sobreviver, e encantar pessoas e serpentes, em meio a tanta diversidade, às vezes é previdente lançar mão de um pouco de mágica.
Um outro filme também tocante, e também muito bem feito e bem interessante, que tive o prazer de rever a pouco tempo é As Pontes de Madison (The Bridg of Madison Country – aquele com Clint Eastwood e Meryl Streep nos papéis principais. Mas nesse o ingrediente catalisador das transformações na vida das pessoas, no caso um casal de meia-idade, é o amor. O amor é, por natureza, subversivo e transformador, você sabe, nós sabemos.
O motivo de citar esses dois filmes é o de pura e simplesmente desejar compartilhar com vocês uma constatação curiosa que me veio à mente e que nem sempre é devidamente levada em consideração: o quanto as pessoas são capazes de, por elas próprias ou motivadas por um outro, operar pequenos milagres em suas vidas, quase sempre sufocadas por uma rotina modorrenta e sem viço.
Cabe aqui então algumas perguntas. Uma espécie de questionário que você responderá em pensamento, a si mesmo, portanto aqui não caberão mentiras, dissimulações e meias-verdades. O quanto de poesia e magia há na sua vida hoje? Quanto de desafio, novidade, criatividade e imaginação há no seu dia-a-dia? Você tem parado ultimamente para pensar em questões como essas? Será que a sua vida está mais para aquele arroz japonês, sem sal e tempero algum, o Gohan, ou está mais para uma suculenta lasanha ou macarronada, uma belíssima feijoada ou uma deliciosa moqueca de camarão?
É..., às vezes, estamos tão preocupados em viver a rotina, quase que como escravos, que esquecemos de por uma pitada de sal, digo, de poesia em nossas vidas. E a vida vai seguindo seu curso, assim meio que “no piloto automático”, meio que sem querer, sem nos darmos conta. Não é mesmo?
Quanto de poesia e magia há na sua vida hoje? Pense nisso! Quanto? Será que em quantidade e qualidade suficientes para não permitir que a sua alma fique insossa, desbotada, embotada por tantas tarefas, afazeres e responsabilidades acumuladas, por toda essa rotina sufocante e estressante que, muitas vezes, nos arrasta, arrasa e aniquila sem sequer percebermos?
Será que você tem se dado a oportunidade de fazer novas amizades? Quantas vezes, por exemplo, você já foi ao cinema ou ao teatro esse ano? Quantos espetáculos de música ou de dança terá assistido? Quantas taças de vinho ou champanhe terá tomado? Quantas embriaguezes prazerosamente experimentadas? Quantos sorrisos? Quantas gargalhadas daquelas bem gostosas? Quantos beijos embriagadores?
Há quanto tempo você não se dá um feriado e falta ao trabalho para, pura e simplesmente, ficar só, sozinho, sem fazer nada, curtindo um “ócio elegante”, ou mesmo uma pequena pausa para ir ao cinema com a esposa , com os filhos, com um(a) amigo(a)? Há quanto tempo você não faz amor bem gostoso com alguém – nem precisa ser com o amor da sua vida, que isso nem se sabe se existe mesmo, mas com alguém que você ame de fato ou por quem, pelo menos, tenha um enorme carinho e tesão. Há quanto tempo não ousa fugir, um pouco que seja, da rotina?
O quanto você tem refletido sobre o seu mundo? E sobre o mundo que lhe cerca!? O amor e a amizade têm permeado ou servido de alicerce para o(s) seu(s) relacionamento(s) com o(s) outro(s)? Quantas vezes você já disse ao seu pai, à sua mãe ou ao seu companheiro, ou companheira, o quanto os ama? Declare, sem pudor, o seu amor!
Declare!
Desculpe se lhe incomodo com tantas perguntas. É que, de repente, com o passar dos anos, com o passar da vida e dos filmes, a gente se dá conta de que são essas coisas que realmente importam na vida. E a gente perde tanto tempo correndo atrás de coisas sem importância e, muitas vezes, até de coisas as quais a gente nem sabe ao certo o que sejam, ou para o que servem, e por que, afinal, estamos há tanto tempo atrás delas.
Assista a mais filmes. Vá mais ao teatro. Leia mais livros, principalmente livros de poemas. Saia mais para jantar fora, para celebrar os dias. Vá mais ao campo, às praças. Olhe mais os pássaros e as flores. Faça mais amor. Cultive mais a amizade. Tenha mais fé, em Deus, mas, e principalmente, em você mesmo. Ponha mais poesia, sal e magia no seu dia-a-dia. E, não se esqueça, leia bons livros, assista a bons filmes, como Bagdá Café e As Pontes de Madison. Você verá as transformações que a arte é capaz de operar na vida da gente, de toda a gente.
Lula Miranda.
Eu li esse texto do Lula Miranda hoje num jornal que todos os dias recebo online.
Como sou fã do Lula, e como esse texto me comoveu tão profundamente, resolvi postá-lo.
Ele fala coisas tão lindas aqui que vale a pena ler...
É uma ode à delicadeza que está sendo esquecida pelas pessoas nos dias de hoje e que faz a total diferença, é o "sal" da vida..
Só acrescento a essa lista de filmes o Lost in Translation (Encontros e desencontros)... Muito lindo.
Bjo.
Música: The Rena Song do cd An Evening with John Petrucci & Jordan Rudess.
Um comentário:
B e a u t i f u l ! !
Kisses,
Marcia
www.fotolog.net/marcchia
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